Direção: Quentin Dupieux
Roteiro: Quentin Dupieux
Elenco: Anaïs Demoustier; Gilles Lellouche; Edouard Baer; Jonathan Cohen; Pio Marmaï; Didier Flamand; Romain Duris

Por Maria do Carmo Alvarenga
Escrito em 20/02/2024 e modificado em 07 de agosto de 2024
Daaaaaali! foi o primeiro filme que assisti no cine Méliès, em Saint-Étienne e o meu début em cinemas na França. Um acontecimento que pode ser banal para muitos, mas para mim, que amo a sétima arte — além de, naquele momento, estar fazendo uma imersão no país, que mesmo antes de conhecê-lo, sempre nutri grande paixão — assistir a um filme num telão francês é uma experiência inesquecível.
O Daaaaaali! de Quentin Dupieux é surreal como tem de ser. Ele coloca em cena seis atores de idades diferentes que dão vida ao excêntrico pintor. Parece-me que a quantidade de letras A contidas no título fazem referência às seis versões de Dali no roteiro. O pano de fundo é um documentário que uma jornalista tenta realizar com o artista, que é perfeccionista e a faz retornar muitas vezes para gravar a entrevista. Mas, estamos falando de uma figura excêntrica e o realizador Dupieux brinca magistralmente com essa característica e com o surrealismo presente em todos os aspectos do filme. Os seis intérpretes se esforçam para representar um ser caricato e exageram, por exemplo, na pronúncia do r, o que destoa do som suave dessa letra na fala dos franceses.
A direção de arte é sensacional, transformando elementos e até quadros inteiros do artista em cenários e composições visuais. No desenrolar da história, somos presenteados com releituras que dão vida às célebres obras de Dali, como: A face da guerra, O sono, A persistência da memória e vários outros elementos que tanto remetem ao absurdo, como transfiguram-se em cenas carregadas de comicidade. O roteiro, como é de se esperar, é composto de uma não-lógica surrealista. Em um certos momentos, a nossa cabeça dá um nó e começamos a pensar que há uma falha de continuidade ou que a história não faz sentido, para mais na frente pensar « ah, então era isso… ».
Diante do riso, existem coisas sérias a serem tratadas… ou refletidas… O objetivo de ter seis atores de idades diferentes é retratar um Salvador Dali vaidoso, mas que se sentia desconcertado vendo o tempo passar, a juventude esvair-se e, consequentemente, a chegada da velhice. Talvez, o pintor até temesse a proximidade da própria morte. É um chamado à reflexão de que a vida é efêmera, que nossas obras podem ser eternas, mas nós, seres humanos, não somos. Isso é o que mais me encanta no cinema. Gosto de assistir à filmes que nos fazem sair da sala com várias pulguinhas atrás da orelha, nos incomodando para pensar, refletir, conversar sobre e, para os que gostam, expressar-se em escrita ou em outras artes, todos os sentimentos provocados pela projeção no telão. Sim, porque cinema é uma experiência; é a criatividade em cores, imagens, sons e vida para contar histórias que tocam, encantam e emocionam.
O Daaaaaali! de Quentin Dupieux me emocionou pela obra em si e por me iniciar, magicamente, em minha imersão nos cinemas franceses.
Deixe um comentário